Leio. Releio. Volto a ler. Viro páginas. Avanço linhas.
Palavras minhas eu assino, dos outros eu transcrevo, dum passado que não teve futuro, dum presente que nunca exi stiu.
Frases que me fazem sorrir, outras que me inundam o olhar.
Histórias que fazem a minha história, remotas ou recentes, e que por muitas letras que destrua ficarão sempre na memória.

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Desejo a você total liberdade para que rasgue páginas neste espaço. Rasgar, romper, transformar algo em outro novo, mesmo que a si mesmo.
A vida é uma sucessão de rasgos, remendos, feituras e escolhas.
Esteja LIVRE!



sexta-feira, 23 de fevereiro de 2007

Ele soube mexer na Rainha

Toda a vida das sociedades nas quais reinam as modernas condições de produção se apresenta como uma imensa acumulação de espetáculos. Tudo que era vivido diretamente tornou-se uma representação.


O trecho é a abertura do livro “A sociedade do espetáculo e Comentários sobre a Sociedade do Espetáculo”, de Guy Debord (Editora Contraponto), e me veio à cabeça quando assistir “A Rainha”, obra de um dos meus cineastas favoritos, o inglês Stephen Frears. Disputando o Oscar do próximo domingo, 25, com seis indicações, incluindo melhor filme, melhor diretor, melhor roteiro original e melhor atriz para a impressionante Helen Mirren, o filme opõe o velho e o novo nas figuras da rainha Elizabeth II e da princesa Diana.

Frears fez um filme inspirado em fatos reais – a semana que separa a morte da princesa do seu funeral. Era verão na Inglaterra e a família real havia se mudado para sua propriedade de férias, na Escócia. A distância geográfica e a disposição de preservar a realeza dos holofotes da imprensa, além da profunda antipatia que nutria pela vida mundana de Diana fazem com que a rainha decida ignorar o apelo emocional e popular sobre a morte da princesa e tratá-la como “ex-integrante da família real”.

Enquanto isso, o recém-empossado primeiro-ministro Tony Blair vai se rendendo ao marketing político, às manchetes de jornais, às exigências da popularidade, ao espetáculo do qual fala Debord. É desse embate que se alimenta a trama de Frears, aparentemente a favor de Blair e de Diana, mas aos poucos sutilmente crítico da armadilha novo=bom e velho=ruim.

Aos poucos, como já tinha apontado Ricardo Calil no Olha só, o espectador vai sendo sutilmente levado a rever as suas posições aparentemente fáceis – se o filme começasse e terminasse com os protagonistas fixos nos seus papéis de mocinho e bandido não teria a menor graça. A delicadeza da direção de Frears está em mexer na rainha e, como num jogo de xadrez, encurralar o espectador numa espécie de xeque-mate.

Enquanto isso, põe em questão todo o circo do qual se alimentam as celebridades, as manchetes de jornal das quais se vangloriam os políticos. Mas deixa o espectador sem saída na medida em que não permite a nostalgia fácil de desejar andar o relógio para trás e voltar para a época em que a sociedade do espetáculo ainda não nos dominava. Nem por isso eram tempos mais “autênticos”.

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