- Parece que já chegou o Outono.
- Já dei conta...
Melhor assim. Época de renovação. Época de deixar cair de mim as mágoas como folhas. Tempo de deixar partir todos os restos com o vento.
Tempo de esperar que passe o Outono, o Inverno e que depois, quem sabe na Primavera, tudo se renove lá fora e por dentro de mim.
Chegam as noites mais cedo, mais frias. E descobrem-se outros prazeres...
A casa nova, as almofadas coloridas, o café em canecas grandes que me aquecem as mãos enquanto fico enroscadinha no sofá branco para ver um filme qualquer. Os banhos quentes que transbordam espuma, à luz de velas. Os pijamas e os lençóis, as meias, os edredons fofinhos.
O caminhar sobre as folhas secas...o sentir na orla da praia as norteadas que me congelam o rosto e despenteiam os cabelos. E tudo vazio...
Como se de repente desse conta, numa areal deserto, que o mundo terminou e só fiquei eu.
O Outono pode ser nostálgico, sim. Já não há aquele calor que nos sufoca, que nos faz desejar sair de alças e roupas leves. Viajar para sul de corpos que ainda não se conhecem e que só desejamos ter coragem para lhes conhecer o sabor e o cheiro.
Chega o Outono e perde-se a vontade de atravessar a noite por todas as ruas, sentindo o pulsar da terra, de olhos fechados para se ver melhor.
Chegou o Outono... e à medida que ouço os meus passos, num qualquer lugar de onde vejo o pôr do sol, sei que tudo ficará bem. Porque não há outra maneira de viver...
Porque sei que em cada folha caída, em cada lágrima vertida, o peito transforma a tristeza em esperança, bate de novo, compassado, como um rumor de rio sem corrente...e nas veias corre outra vez o sangue alucinado de quem sente que ainda tem tudo para viver.
Sim, já notei que é Outono outra vez...
Mas pouco importa...o aconchego de uns braços que nos querem bem, também nos faz olhar a vida a renascer em nós...
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